Pesquisar

segunda-feira, julho 17, 2017

Silval Barbosa afirma “Os secretários cobravam propina com o maior prazer”,

Ex-governador é réu confesso da ação e devolveu R$ 46 milhões em bens para ser solto
O ex-governador Silval Barbosa, durante reinterrogatório
O ex-governador Silval Barbosa (PMDB) voltou a confessar sua participação em mais um esquema de desvios de recursos públicos do Estado em sua gestão.

Em reinterrogatório ocorrido nesta segunda-feira (17), o peemedebista ratificou seu depoimento à Delegacia Fazendária e admitiu os crimes investigados na 2ª e 3ª fases da Operação Sodoma. A audiência foi conduzida pela juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital.

Estas fases, deflagradas no ano passado, apuram esquema consistente na exigência de propinas milionárias aos empresários Willians Mischur e Julio Tisuji, donos das empresas Consignum e Webtech, respectivamente, em troca da concessão e manutenção dos contratos destas empresas com o Estado. O lucro obtido supera a faixa de R$ 18 milhões. 

Silval estava preso desde setembro de 2015 e conseguiu prisão domiciliar no mês passado, após confessar os delitos e devolver R$ 46 milhões em bens aos cofres públicos.

Confira como foi a audiência:

Silval chega ao Fórum (às 13h41)

O ex-governador Silval Barbosa chegou ao Fórum da Capital acompanhado do seu advogado Délio Lins. Também foram à audiência o ex-secretário adjunto de Administração, coronel José Jesus Cordeiro, e o ex-prefeito cassado de Várzea Grande, Walace Guimarães, ambos réus do processo.

"Vou falar tudo o que eu sei" (às 14h22)

Silval lembrou que anteriormente havia negado os fatos, mas que hoje é réu confesso e que se sente na obrigação de se retratar de todas as denúncias. 

"Vou falar tudo que sei, daquilo que participei, de quem praticou e quais as vantagens. Em relação a essa denúncia, eu confirmo que é verdadeira".

Dívidas de campanha (às 14h26)

De acordo com o ex-governador, o esquema começou em 2011, quando ele nomeou César Zílio - que hoje é delator - para a Secretaria de Estado de Administração. Zílio já havia participado da campanha como coordenador financeiro do então governador.

"Convidei-o para assumir a secretaria e, no início, havia muitas dívidas de campanha. Em todas as campanhas, principalmente majoritárias, existe o famoso caixa 2. Em uma campanha você gasta conforme o calor do momento e na minha ficou bastante dívida. Então chamei o Cesar, que era uma pessoa de bastante confiança, e pedi para ele ajudar a resolver essas dívidas".

Como o Cesar já controlava isso, ele continuou operando durante alguns meses. Depois de um certo tempo, ele nem me passava mais o dinheiro. Ele sempre me passava R$ 250 mil, nada mais do que isso

"Eu falei para ele da Consignum, e ele conversou com o Wilians [Mischur]. Ficou acertado que ele [Mischur] pagaria R$ 400 mil por mês. Se em algum momento ele pagou R$ 700 mil, não é do meu conhecimento". 

Repasses (às 14h32)

Mesmo com a saída de Zílio da secretaria, Silval disse que o ex-secretário continuou operando o esquema "de fora"

"Como o Cesar já controlava isso, ele continuou operando durante alguns meses. Depois de um certo tempo, ele nem me passava mais o dinheiro. Ele sempre me passava R$ 250 mil, nada mais do que isso".

Em dezembro de 2013, o ex-governador disse que chamou Pedro Elias para comandar a secretaria e retomar à rotina normal de pagamentos de propina. Elias também é delator do esquema. 

"Ele [Pedro Elias] veio para ter controle disso. Mas depois eu o chamei e disse que estava chegando no final do ano e, como o [advogado Francisco] Faiad pretendia concorrer na eleição em 2014, disse que ia nomear o Pedro Elias na secretaria e pedi para ele operar esse esquema da Consignum".

"O Pedro Elias passou só uma vez o recebimento para mim, no valor de R$ 500 mil. Ele ficou com R$ 100 mil".

"Faziam com prazer" (às 14h41)

Silval também rebateu a tese de que os ex-secretários de Administração eram pressionados por ele a fazer a cobrança de propina. 

"Eles não eram pressionados, eles iam com maior prazer principalmente porque sabiam que tinha vantagem. Assim como os empresários: só fazem porque tinham vantagem. Nunca eu cheguei em uma pessoa e falei: 'Você é obrigado'. Em nenhum momento, eles faziam com satisfação".

O ex-governador afirmou que Cesar Zílio passava cerca de R$ 240 mil mensalmente durante os 30 meses do contrato, o que resultaria em cerca de R$ 7,2 milhões em propina no período.

Interesse de Riva (às 14h49)

De acordo com o ex-governador, no final de 2013 o então deputado José Riva - também réu confesso - o procurou dizendo que tinha uma empresa interessada para operar os empréstimos consignados no lugar da Consignum. 

"O Riva vinha com força política e cobrava duro. Eu chamei o Pedro Elias, não queria briga com o Riva, e falei para abrir uma concorrência e pedi para ele conversar com o Riva. O Pedro Elias conversa muito com o Riva. O Riva apresentou a empresa Zetra. Ele sabia do esquema da Consignum e dizia que a Zetra iria ajudar mais".

Quando o Riva disse que eu devia a ele, é mentira, eu não devia nada para ele. O Riva ia enfrentar uma candidatura majoritária pra governador e precisava desse contrato para isso

"Foi feita a concorrência e a Zetra ganhou. Mas a Consignum conseguiu uma liminar na Justiça para anular a licitação. Depois disso o Wilians buscava a todo momento falar comigo. Para que eu renovasse esse contrato, mas eu não atendia".

Citação de Paulo Taques (às 14h53)

Silval contou que durante um feriado em que estava na casa de seu irmão, Willians Mischur chegou ao local e disse que queria renovar o crédito, pois estava o afetando. 

"Ele alegava uma série de situações. Eu disse que não queria mais briga com a Assembleia e com o deputado Riva. Ele chegou a dizer que já tinha falado com o Paulo Taques [ex-secretário da Casa Civil da atual gestão] que caso o grupo dele ganhasse a eleição o contrato ia ser mantido";

"Eu falei com o Riva para resolver isso e eles se acertaram. Eu sei que o Wilians foi junto com o Pedro Elias na casa do Riva e eles se acertaram. Até então era 2,5 milhões. Quando o Riva disse que eu devia a ele, é mentira. Eu não devia nada para ele. O Riva ia enfrentar uma candidatura majoritária pra governador e precisava desse contrato para isso. Eu não determinei ao Pedro para tratar esse assunto com Riva. Só falei para ele acabar com esse cabo de guerra entre Governo e Assembleia. Só depois eu fiquei sabendo que ele recebeu". 

Propina para ex-prefeito (às 15h01)

Silval afirmou que nunca tratou desse esquema da Consignum com seu ex-assessor Silvio Araújo, com o ex-secretário adjunto de Administração, José Cordeiro, com o ex-chefe da Casa Civil, Pedro Nadaf, nem com o ex-secretário de Estado de Fazenda, Marcel de Cursi. Os quatro também são réus. 

Ele também isentou seu filho, o empresário Rodrigo Barbosa, nesses pagamentos específicos. 

"O Silvio uma vez foi pegar o valor para mim com o Pedro Elias, mas ele não sabia de nada. Nesse negócio nem o Rodrigo Barbosa sabia, era amigo pessoal do Pedro Elias apenas".

Conforme o ex-governador, também houve um esquema envolvendo gráficas para arrecadar dinheiro para a campanha de Walace Guimarães para a Prefeitura de Várzea Grande. Walace foi cassado por caixa 2 no meio do mandato. 

O Cesar e o Walace dizem que me passaram R$ 1 milhão. Eu não lembro, mas como era muita coisa pode ser que sim. O Cesar ficou com R$ 1 milhão e pouco

"O Walace era deputado estadual e estava concorrendo a campanha para prefeito de Várzea Grande. Ele se reuniu comigo e disse que precisava da minha ajuda. Ele disse que esteve na secretaria conversando com o Cesar Zílio, e afirmou que conhecia algumas gráficas que participaram da licitação e queria que eu autorizasse as gráficas para dar um retorno".

"Aí eu chamei o Cesar e perguntei o que era possível fazer. O Cesar disse que dava para fazer alguns contratos, e foi executado. Eu autorizei e foi feito, mas nunca estive com nenhum dono dessas gráficas. O Cesar e o Walace dizem que me passaram R$ 1 milhão. Eu não lembro, mas como era muita coisa pode ser que sim. O Cesar ficou com R$ 1 milhão e pouco".

Dedurou o filho (às 15h10)

Embora tenha confessado o comando do esquema envolvendo a Consignum, Silval disse que não participou das exigências de propina da empresa Webtech, do empresário Julio Tisuji.

"Nunca acertei nada com ele [Julio]. Tomei conhecimento que o Cesar Zilio acertou com ele e cobrou propina dele durante dois anos. Sei que quando o Pedro Elias assumiu a secretaria, ele procurou o Julio e também acertou com o Julio. Isso eu fiquei sabendo depois que parte desse dinheiro era passada pelo Pedro para o meu filho".

Segundo Silval, seu filho lhe confessou que recebeu propina por intermédio do ex-secretário Pedro Elias.

"Eu não recebi nada, só o Rodrigo. Mas ele não conversou com o Julio, só com o Pedro Elias. Ele [Rodrigo] recebeu cerca de R$ 380 a R$ 400 mil".

O ex-governador, porém, disse que seu filho não mantinha contato com empresários para exigir propina, ao contrário do que consta na denúncia.

Esquema paralelo (às 15h17)
Quando o chefe libera a guarda, os secretários avançam o sinal. Como nesse caso do Cesar Zílio e Pedro Elias no esquema com a WebTech. Eu não sabia, eles operavam sozinhos

Silval também negou ter participado do esquema no que tange à compra de um terreno de R$ 13 milhões pelo ex-secretário Cesar Zílio, com dinheiro de propina.

"Com relação a esse terreno da Avenida Beira-Rio, eu só fiquei sabendo depois da operação. Nunca participei, não recebi valores, nada. Do que eu recebi, que é da Consignum nesse caso, eu paguei uma série de coisas de campanha".

"Eu liderei esse esquema com a Consignum. Mas deixa eu explicar para a senhora: quando o chefe libera a guarda, os secretários avançam o sinal. Como nesse caso do Cesar Zílio e Pedro Elias no esquema com a WebTech. Eu não sabia, eles operavam sozinhos". 

Sem vítimas (às 15h24)

O ex-governador voltou a afirmar que não existiu nenhuma vítima no esquema. 

"Mas uma vez eu ressalto: não tem ninguém que participou de tudo isso que foi vítima, como o Cesar Zílio quis se colocar".

A promotora de Justiça Ana Bardusco questionou de que forma Cesar Zílio entregava propina a Silval. 

"Era em dinheiro. Ele me entregava no gabinete, numa sala, deixava na gaveta, no chão, ou na minha casa, ou na casa dele". 

Caso pontual (às 15h42) 

Silval relatou que seu filho não é integrante da organização criminosa comandada por ele.

"Com certeza absoluta o Rodrigo não fazia parte de nenhuma organização. Ele participou de um caso pontual apenas. Se ele falasse comigo antes de receber [a propina], com certeza eu não autorizaria.

Ana Bardusco questionou em que momento Silval descobriu que Rodrigo Barbosa recebeu valores a título de propina.

"Bem depois. Não sei se antes ou depois da operação, o próprio Rodrigo me contou. Ele só disse que recebeu umas três vezes e que no total dá esse valor de R$ 380, R$ 400 mil". 

"Riva aproveitou a oportunidade" (às 16h08)

A promotora também perguntou se Silval sabia das negociações de compra e venda de gado feitas entre Cesar Zílio e Pedro Nadaf. 

"O Cesar nunca conversou comigo desse terreno, de gado, da construção da casa dele. Eu não sabia que o Cesar simulava contratos, que ele agia até com pai morto, só soube disso tudo na denúncia".

Silval ainda negou ter feito qualquer ameaça no âmbito da organização. 

"Tem na denúncia que às vezes era comum fazer ameaças nas mesas de negociações. Isso nunca houve, eu nunca presenciei e se também tivesse presenciado não iria admitir".

A defesa do ex-deputado Riva perguntou porque Riva só recebeu propina ao final do contrato, uma vez que, segundo Silval, o ex-deputado tinha grande força política. 

"Foi quando ele tomou conhecimento que tinha retorno, não sei de que forma, e ele aproveitou a oportunidade. Como eu relatei, eu acertei com Wilians que se ele acertasse com o Riva. Estava tudo ok. E o Riva precisava também, ia entrar em campanha eleitoral".

"Eu não devia nada para o Riva, não existia dívida. Eles se acertaram, foi renovado o contrato e não foi mais falado no assunto. Comprei a fazenda de Colniza com o Riva, fiz essa sociedade com ele, mas vou detalhar isso em outro momento". 

O depoimento é encerrado.

Ouça depoimento completo dado à Justiça abaixo:

Por LUCAS RODRIGUES E THAIZA ASSUNÇÃO 

Nenhum comentário: